sábado, 14 de novembro de 2009

O Glamour de um Sabado a Noite



Ha muito me libertei da ideia fantasiosa de que viver em Nova Iorque e puro glamour.

Pelo vigesimo sabado consecutivo, a possibilidade de botar aquele salto alto, a maquiagem comprada ha um mes e nunca usada, parece bem improvavel. Como se eu nao fosse mais uma jovem solteira independente, absolutamente sublimei a possibilidade de botar o narizinho para fora de casa. Nada de mulher moderna desfilando pelo Lower East Side.

Nao me pergunte por que. Sei que fiz as unhas, botei o pe de molho e a cabeca, enrolada numa toalha, melequei de creme para tratar meus cachos danificados.

Ainda existe um pouco de culpa de estar linda e hidratada dentro de casa, e minhas vontades se misturam inclusive a falta de habilidade em detectar minhas vontades, entao a multidao em mim mesma vira uma tremenda muvuca, isso sim. Um baita empurra-empurra.

Agora, so sei que o sabado ja virou domingo.
E um cheiroso boa noite a voces!

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Uma desadivinha


As tradicionais adivinhas são aquelas que lêem, vêem, sonham o futuro, e ele acontece. Usando de mãos, de cartas, de bolas de cristal, de borra de café, de búzios, de intuições mais diversas; elas pensam e ele acontece. O que pouca gente sabe é que existem - algumas poucas pobres soltas por aí - desadivinhas. Eu, pessoalmente, me enquadro no grupo das desadivinhas que têm visões. Tenho, constantemente - há algum tempo - tido visões. Dirijo e vejo todos os acidentes que poderiam acontecer naquele instante, cozinho e cheiro todas as combinações que poderiam surgir, sonho e desenho as mais inúmeras possibilidades encontrivas (e desencontrivas). E nada acontece. Andava frustrada com a minha inaptidão paranormal, quando me dei contei que o único problema na história era justamente a minha linha de raciocínio. Claro que sou uma péssima adivinha, porque eu sou uma ótima desadivinha. E faz todo sentido do mundo as desadivinhas existirem. Nesse mundo em que tudo tem o seu equilíbrio, seu oposto, seu contraponto, seu yin-yang, branco e preto, positivo e negativo, adivinhas e desadivinhas. Assim como é útil ter alguém que adivinhe o futuro, tenho percebido como é fundamental ter os desadivinhos soltos por aí. Começei a me convencer que muitos mais acidentes e fatalidades aconteceriam se não fossemos nós, desadivinhos. Todas as coisas horríveis que eu sinto e vejo acontecendo todos os dias, não acontecem! Naquele instante que o poste poderia ter caído, que o carro poderia ter derrapado, que o copo poderia ter quebrado e um dos cacos voado para o olho do segurança que faria um movimento brusco e derrubaria a senhora no chão. Não. Nada acontece. E eu vi tudo acontecer. E senti tudo acontecer. E exatamente porque eu senti e vi, tudo segue. Sem poste caído, sem derrapada ou copo quebrado. Mas, por óbvio, o lado ruim está presente: pensar e ver coisas e surpresas boas que poderiam acontecer, pessoas que poderiam chegar, abraços que eu poderia ganhar, ligações para receber. Vejo tudo, só para o tempo passar e elas não acontecerem. Pois é. Nada agradável. Ou pior ainda: ser pega desprevinida, com um terrível solavanco desses de derramarem água dos olhos, e pensar - depois do acontecido acontecer - que bastaria ter pré-visto e nada disso aconteceria. Enfim, a vida de uma desadivinha não é nada fácil. Mesmo. Ainda mais de uma tão sonhadora. Pé no chão seria a solução? E que venham as bolhas da caminhada? Bem que voar poderia não ser tão atrativo assim. Bem que.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

O desembuchamento


O desembuchamento das palavras é uma das coisas mais complicadas desse mundo de meu deus do céu. Em boca fechada não entra mosca, mas também não saí som: por essa a minha vó não esperava. E se o som não sai, alguma idéia de para onde ele vai? Isso mesmo. Não vai. Fica. E ficando o volume só aumenta, as frases se machucam e os olhos só se enchem. E esses sim, não fazem a menor cerimônia de manterem suas respectivas torneirinhas fechadas. O não-desembuchamento é mais complicado do que trânsito em hora do rush. Ou talvez seja exatamente como trânsito em hora de rush: é um saco, mas quando já se está lá parado dentro dele, não tem o que fazer. Pode se desesperar o quanto quiser, de lá - tão cedo - você não sai. E todas aquelas cenas poéticas e romanticamente passionais de pessoas gritando umas com as outras, falando, sem filtro nenhum, tudo aquilo que passa pela cabeça, nem ligando para o que isso tudo pode causar... todas elas se tornam miragem: aquela curva lá na frente que parece estar descongestionada. Lá na frente. Parece. Quem sabe. Ouvi dizer, eu acho. Ou não. Mas a certeza de sentir o calor queimando no braço do motorista, o suor surgindo no abafamento do carro embaixo do sol e a cabeça latejando de tanto pensar em todos os milhares de caminhos que se poderia ter pego e assim evitado o trânsito, ah, essa certeza é bem clara. Bem alta. Bem retumbante entre os meus dois ouvidos. E poderia ser diferente com tanto som acumulado? O escrever ajuda, mas é como ligar o rádio quando se está parado no congestionamento, remedia, mas não resolve seu problema. E tem horas que nenhuma música boa toca, aí sim. Aí é a hora do não-desembuchamento mesmo. Quem me dera ser desses leves desembuchadores, que falam com a mesma desproblematização com que respiram. Quem me não ter insônia, nem essa sinfonia de sons distorcidos zumbindo na minha cabeça. Quem me dera, talvez, um dia, me tornar uma desembuchadora, cortar os fios que me prendem e arranjar um desses megasuperduper carros que passam por cima dos outros e nunca pegam trânsito nenhum: eles só passam.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Fecho os olhos


Fecho os olhos e me imagino no campo. Pequenina e com uma cestinha vermelha na mão. Faz sol. Vejo um cavalo marrom correndo em câmara lenta. Penso que essa referência é muito brega e apago o cavalo dos meus pensamentos. Me imagino então correndo para casa, aquela casinha de madeira lá no pé da montanha. Fica num vale. E tem um rio que passa bem na frente e eu me banho lá. É frio, mas é gostoso nos dias de sol. E gosto de ir com meu maiôzinho amarelo. Tem uns meninos que pegam piabinhas e comem cruas mesmo. Aí me canso dessa história besta e tento imaginar outra coisa. Com essa música da Bjork de fundo fica difícil. Agora mesmo ela está tendo um chilique! Bom, aí fecho os olhos de novo e me lembro de uma imagem brutal que vi num filme: um garoto cego de Madagascar andando de bicicleta. Eu fiquei tão impactada por aquela cena que não posso evitá-la em minha mente. Ele passeia com uma risada sufocada, quase sem ar. Nota-se que é uma sensação forte. Tente andar de bicicleta com os olhos fechados! Me entedio com essa história de brainstorm e busco uma tacinha de vinho do porto, pra ver se me ajuda. Aproveito e acendo um cigarrinho pra acompanhar. Pronto. Vejo uma foto minha com uns seis aninhos no clube, de uniforme, perto da ducha. Quando éramos pequenos e estudávamos à tarde, minha mãe ia com a gente pro clube de manhã. Passávamos a manhã lá, sozinhos, brincando. Umas onze e meia tomávamos banho numa ducha e vestíamos o uniforme. Íamos pra casa já prontinhos. Era só almoçar e ir pra escola. Eu gostava. O parquinho, a piscina rasa, a cancha de areia... Aí me lembro do Jojo, que tinha mesmo uns seis anos na época em que o conheci. Ele é um verdadeiro personagem. Quem o conhece, sabe. Tão pequeno ao lado daquele professor, mas cheio de personalidade. Aproveito a viagem pra longe e me lembro do vendedor de sapatos da Tunísia com sua simpatia única. Lembro-me também do Nagib, o taxista mais gente boa que conheci. “Chicas, la medina por la noche, no. Cuchillo, cuchillo.” E na mesma linha tem também o beco da facada, identificado pelo velho Caza perto da estação de trem de Lisboa. É pertinho, mas melhor irmos de táxi, não? Cara, eu tenho muita história com taxista. Teve o que me botou pra fora no meio da rua, cheia de malas e com a sandália arrebentada - num dia de verão em que o asfalto pegava fogo. Que feladaputa! Putz, derramei o vinho do porto em cima das havaianas. Humpf.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

O limite


A gota que faltava para transbordar, a força que faltava para romper. Quando a linha está por arrenbentar, como saber qual é o ponto em que ela vai, de fato, arrenbentar? Quando chega a hora certa de falar, de pedir, de agir, de perdoar. Como saber qual é a hora certa de pedir um beijo, uma ajuda, um café? Que a mágica existe e acontece, eu não duvido. Mas o que fazer na hora em que ela some? Em que parece que a engrenagem antes silenciosa e funcional, já está seca e rangedora a mais tempo do que deveria? Na hora em que o tênis molhado começa a, não só, pesar, mas a incomodar. Saber a hora de sair nunca foi minha especialidade. Sempre muito apressada, muito ansiosa, acho que costumava sair antes da hora, em todo espetáculo importante. Mas e agora? E se ele já acabou e eu não enxerguei, perdida no meio das minhas auto-medições, nessa busca ensurdecedora pelo meu limite, pelo meu equilíbrio.

Se o timing eu perco e - dizem - ele é tudo, o que me sobra? Eu me sobro ou me falto? Me basto ou me incompleto? Sempre tão tênue a distância entre a harmonia e o caos. Sempre tão oscilante entre os dois que, ao que parecer, o oscilar é, paradoxalmente, a minha constância. Meu mais frequente jeito de ser: sou variável. É querer os opostos, juntos, ao mesmo tempo, enquanto eu me divido e me somo entre os dois. É querer estar lá, mas gostar tanto daqui. É doer e sorrir ou é não sentir e chorar. É me esconder do jeito mais cretino: me expondo. Me mostro para me esconder, me escondo quando quero que me vejam. Idioticamente esperando quem nem disse que estava vindo. Idioticamente fugindo quando sei que sou esperada. Meu limite é, certamente, algo bem definido e com o qual eu, definitivamente, não me defino bem.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Solitário Jorge


Jorge é uma tartaruga. O último da sua espécie, originária das Ilhas Galápagos. Estima-se que o jovem rapaz tenha uns 110 anos, aproximadamente. Levando-se em consideração que as tartarugas chegam a viver mais de duzentos anos, ele está na flor da idade.

Aí botaram o Jorge em contato com tartarugas fêmeas de espécies (reinos, filos, famílias, sei lá, isso é com as biólogas do blog) parecidas, para tentar reproduzir. Após meses de expectativa, os pesquisadores identificaram que uma dessas tartarugas tinha posto nove ovos. Surgia então, a esperança.

No entanto, o tempo passou e nunca saíram tartaruguinhas daqueles ovos. Tempos depois, outra fêmea botaria ovos. De novo, nada.

Descobriram que Jorge é infértil.

O último exemplar da espécie, a última esperança, não pode reproduzir. Ironias do destino.

Por Marieta Cazarré

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Famintos por pensamento


Um silêncio ensurdecedor tomou conta do espaço. No descer dos créditos, era quase possível escutar o ronco de consternação de estômagos previamente alimentados.
Durante os 110 minutos de exibição de Garapa, o novo documentário de José Padilha, um nó cego se amarrou sorrateiramente na garganta e pegou de surpresa até os que se predisporam às cenas mais perturbadoras. Imagens de uma realidade que normalmente é vista traduzida em números, índices e planilhas, provocaram uma espécie de catarse emocional coletiva, na sala seis do Artplex, em Botafogo.
No seu caso, em especial, a fome crua, dilacerante, brutal, retratada em preto e branco aguçou seus questionamentos sobre o mundo, sobre a natureza dos sentimentos e relações interpessoais, sobre solidão, sobre si mesma. A ingenuidade do menino que agoniza de dor pela dor, e não por sua própria condição miserável, elevou à décima potência sua autocrítica. Sentiu nojo de si mesma pelas tantas lágrimas derramadas por pseudo-problemas incomparáveis.
Visualizar uma criança morrer a cada cinco segundos no mundo, de fome, não nos permite a infelicidade por ninharias existenciais e nos obriga um posicionamento.
“Você não tem o direito de ser infeliz”. A frase tantas vezes pronunciada pela mãe, enfim, fez sentido. É covardia chorar por qualquer outra razão que não seja o estômago ecoando, experiência vivida diariamente por cerca de 920 milhões de pessoas no mundo, segundo o órgão das Nações Unidas para a agricultura e a alimentação, FAO.
No filme, três famílias do interior do Ceará são o espelho de uma legião de famintos, eufemisticamente enquadrados na situação de insegurança alimentar grave. Para enganar a fome dos filhos, água suja com açúcar que dá nome ao filme.
Garapa deve ser visto, não para ser julgado, sequer para ser apreciado. Deve ser visto para instigar uma outra fome, a de pensamento.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Água rosa com açúcar


Na nossa inofensiva meninice, com delicadas superfícies macias, penteados cabelos brilhosos, sorrisos ornamentais e gestos coreografados, somos aquela inofensiva água com açúcar, que vovó já recomendava como calmante para os momentos conturbados. Somos calmamente pedaços soltos de cetim rosa que deve não só voar, mas flutuar com graça e eleganância pelas esquinas da vida. Não carregamos peso, não sujamos as mãos, não conseguimos nos defender das todas inúmeras perigosas artemanhas do mundo. Somos princesas. Gatinhas. Rosinhas. Doces. E ai da princesa que vomitar com tanto açúcar. Ah, sim. Por que princesa não vomita. Nada fisiológico nos acomete. O parto então, é quase um momento de perfeita iluminação cenográfica, em que todos os ângulos mais favoráveis são capturados. Se for uma bebê-menina, nem precisaria ser dito: já nasce com babados e brincos. É um milagre. Devemos esperar comportadas, comer pouco, beber de forma graciosa. O melhor é que nem se beba, mas vinho é aceitável. Branco. Ou rosa, obviamente. Bichos de estimação são permitidos, desde que sejam fofos. A fofura é outro aspecto essencial. Temos que ser fofas, meigas. Inteligência não é tão essencial assim, mas caso esteja presente é aceitável desde que não seja voltada para algo não feminino, como política, mecânica. Nossa senhora do santo batom nos proteja e a todas nossas filhas de que uma menina nasça com isso. Avecruzvirgecrispim. E quando se trata de sedução (ou seria melhor dizer do romance, já que pode não pegar bem para uma menina tão rosácea como eu falar de sedução)? Somos como vítimas nos assuntos do coração. Esperamos que o destino (ressalta-se que o destino, com seu poder incomensurável, só poderia ser um substantivo masculino, certo?) nos traga a alegria, que o cavalheiro charmoso magicamente nos encante ou - talvez, pobre de nós - um jovem mal-intenciondo nos seduza e nos arrebate do chão. Ai de nós. Vítimas do destino, dos cavelheiros ou da sedução. Pobres criaturas inofensivas que nada sabem, nada tem culpa, nada desejam, além de mais cremosia para nossa existência. Ainda bem que enjoar é algo bem feminino e que ninguém vai me julgar se eu desistir de tantas sedas cor-de-rosa por questões de saúde. Sou uma mulher enjoada com tanta água rosa com açúcar que nos afoga, que nós nos auto-afogamos, que afogamos umas as outras, em todos os benditos e perfumados dias.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Só vaga-lumes salvam


Quando eu era pequena, meu pai costumava levar nossos colchões para o jardim quando alguma coisa estonteante estava para acontecer no céu. Lua cheia, cometa, eclipse lunar, foguetes, balões de São João, fogos de artifício, vaga-lumes... Qualquer coisa que brilhasse lá em cima, garantia a aventura de uns quinze... Lembro das carinhas dos meus irmãos ansiosos e da força mental que fazíamos enquanto meu velho ligava para as casas de toda a molecada da rua e prometia aos respectivos pais velar o sono da macacada durante toda a “experiência”. Cada “sim”, ainda que desconfiado, era uma explosão de “Eees” e de risadas engraçadas que anunciavam o nível das expectativas para a empreitada.
Escalado o batalhão, começava a etapa de organização do espaço, seguida pela de preparação dos mantimentos e angariação de abrigos necessários para a madrugada a dentro. Para finalizar a logística, litros de repelente para que todos os bumbuzinhos voltassem lisinhos pra casa no dia seguinte. Condição quase contratual.
A noite começava a cair, e armados até os dentes de guloseimas variadas, deitávamos nos colchões e esperávamos pelo show. Qualquer que fosse ele.
Não sei precisar exatamente até que ponto as lembranças que trago guardadas realmente aconteceram. Até porque, a linha entre imaginação e realidade nunca foi muito bem delimitada na minha caminhada. O fato é que descobri dentro delas acontecimentos tão distintos quanto fantásticos que me renderam um surto de felicidade imediata. Chuvas de estrelas-cadente, danças com vaga-lumes, contatos sobrenaturais de terceiro grau, batalhas com armas imaginárias e munição de pipoca...
Precisei recorrer à minhas gavetas de infância, quando me vi sentada no chão do meu banheiro acuada com o tiroteio que se desenrolava a metros da minha casa.
Era uma noite de lua cheia de um domingo como outro qualquer e minutos antes eu, que agora me ajoelhava paralisada nos azulejos gelados, sassaricava pelas ruas de Ipanema na companhia de um i.pod e alguns pensamentos soltos.
Apesar de morar no Rio de Janeiro e de já ter entendido que o que se fala não é lenda, jamais havia em deparado com situação do tipo. Um medo genuíno me tomou conta.
O telefone não pega lá em casa e na falta de alguém dividir a tensão, sobrou novamente para a imaginação. Forrei o chão com algumas toalhas, coloquei os fones de ouvidos e pensei nas histórias do meu pai. Depois de algum tempo, os tiros de metralhadora se transformaram em fogos de artifício, que logo me transportaram para a guerra de pipocas... Entrei num transe gostoso e voltei para aquelas noites mágicas em que a única preocupação era se a quantidade de chocolate per capta seria o suficiente...
Acordei na manhã seguinte, contorcida no banheiro, com uma conversa que tive com a minha afilhada de cinco anos martelando a cabeça.
Estava num daqueles dias em que os problemas nos enchem até a tampa e nos cegam mesmo diante do pôr do sol mais lindo do planeta e, até encontrá-la, já tinha chorado baldes de lágrimas e berrado com meia dúzia de pessoas. Minha cabeça fervilhava, mas para não pagar uma de tia chata, contei a ela uma oração que eu costumava fazer no momento em que o sol se despedia e a noite começava a dar o ar de sua graça --“Primeira estrela que vejo, dê-me tudo que desejo” -- e pedi ela que fizesse um pedid...

– pede você primeiro?!

– saúde, paz, harmoni...

– Ai, madrinha! Pede uma coisa mais interessante!

– Joana, mas essas são as coisas importantes na vi...

Preparei todo discurso de que o equilíbrio é a chave para felicidade e ela saiu-se com essa:

–vááááááários vaga-lumes, por exemplo!!

Bingo. Não é que ela estava certa?

sábado, 9 de maio de 2009

Até logo!


Vai chegando ao fim a minha temporada no Solar da Paz. Depois de quinze dias instalada nesse retiro espiritual, respiro fundo, olho pela janela e deixo Madrid entrar. Vou morrer de saudades. Eu sei.

Mas hoje é dia de festa e nao tenho tempo para pensar na partida. Nem quero. Tenho que comprar o absinto, o rum e a vodca que prometi. Além do gelo, do jamón, da tortilla e do tabaco.

Aproveito o dia ensolarado e ponho aquele vestidinho que nao uso desde o verao passado. Acordei serena depois de mais uma noite povoada de sonhos e decidi que essa despedida vai ser encarada como um “até logo”. Nunca gostei de “adeus”.

É com um sorriso à la Carmem Miranda e com essa alegria brasileira que deixo os meus amigos e volto pra minha terra.

terça-feira, 5 de maio de 2009

O importante é...



Me lembrei da Daya, quando eu passava por um bloqueio de escritora amadora brabo, me aconselhando: "só senta e escreve". Me lembrei da Cadija, e seu primeiro texto aqui, no qual eu pude imaginar perfeitamente ela, com um vestidinho lindo, sentada no café com seu caderno - seguindo o conselho que a Daya me dava de presente anos antes. E foi a imagem da Eta lendo e comentando meus textos religiosa e carinhosamente, com um copo de vinho do lado e um cigarro na mão, o impulso final.

Como quem não sabe o que esperar do verão, alguém cansada das gavetas em desordem, alguém com saudades daquilo que foi (e do que ainda não foi), me apresento aqui. E no meio da minha sensação de solidão no mundo dos sentimentos bagunçados, encontro na minha própria válvula de escape companhia.

(nessas horas eu entendo quando dizem que junto é melhor que separado.)

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Bagunça



As condições da minha casa sempre refletem a minhas condições. Roupas jogadas pelo chão, louça empilhando na pia, cama desarrumada. Dentro dos armários e gavetas, tenha medo. Às vezes me baixa uma entidade limpadora e eu saio arrumando tudo o que vejo pela frente, numa tentativa desesperada de fazer as coisas fazerem sentido, encontrarem seus lugares no mundo. Mas, o comum, é ficar tudo onde está, cumprindo seu papel inercial de imobilidade. Tudo parado no seu lugar, esperando um evento metafísico acontecer e mudar sua realidade. A espera me agonia. Esperar sem saber o que se espera. Mas se espera.

É claro que sempre existe a possibilidade de ajuda externa. Uma pessoa mágica que surge, entra na sua casa - faz plim! - e tudo vai pro seu lugar. Na minha casa isso acontece às quintas-feiras. Saio de casa, deixo a chave na caixa do condominio, e quando volto está tudo limpo, organizado, visualmente em paz. Mas o caos permanece. Não importa quantas pessoas você contrate, as suas gavetas, só você pode arrumar.

Acho incrível como todos nós vivemos e somos impulsionados pelo visual. Pia limpa, cama arrumada, chão limpo igual a casa em ordem. Daya limpa, sorriso no rosto, falando besteiras igual a Daya em ordem. Essa noção de ter uma intimidade inacessível, de ter gavetas trancadas que você é a única pessoa que tem a chave, dá uma dessas sensações incomparáveis de poder e de solidão. Ser capaz de ser e ninguém mais saber. De estar, e ninguém mais saber.

Minha casa é linda, cheia de pequenas coisinhas charmosas espalhadas em cantinhos estratégicos. Ela, vez por outra, fica uma bagunça, com tudo espalhado por lugares diferentes daqueles que originalmente são os seus. Mas toda quinta-feira, magic happens. Tudo fica visualmente confortável. Y todo esta en calma.

Desde que não se abram as gavetas. E que não se olhem dentro dos armários.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Camisa-de-força





Foi lá pelo oitavo apartamento trash em menos de uma semana que uns pensamentos escabrosos, meio a la Agatha Christie, começaram a invadir minha rotina. O bairro era Copacabana e o prédio, nem tão detestável assim. O elevador, confesso, me arrancava arrepios. Sempre destemida, subi ao 13º andar. Abri a porta e, naquele mesmo metro quadrado que antecede a fechadura, permaneci, boquiaberta, por alguns longos minutos. Olhei para o carpete ensebado com uma mancha grande e orgânica, sem cor definida, e imaginei aqueles corpos desenhados em branco que a gente sempre vê em filme policial americano.
Minha imaginação não se conteve e foi logo tratando de encontrar a alternativa mais insólita para aliviar a minha frustração e cansaço diante da epopeia carioca por uma morada decente.
As mortes mais estapafúrdias, de degolamentos a invasões alienígenas sanguinárias, se enfileiravam na minha lista de possibilidades. Um semblante maquiavélico tomou a minha fisionomia e não raro eu me pegava fazendo cara de Hitchcock, sustentando um dos olhos entreabertos...bonita que só!

Do alto de seus 86 anos, Dona Gertrudes, ex-vedete, morreu enforcada. Enforcou-se com o próprio desgosto pela frustração de exibir, ao invés das curvas torneadas e do viço de outrora, uma aparência decadente de quem se agarra ao passado de um igualmente decrépito Chacrinha para não deixar o tempo passar.
Parada respiratória. A vizinhança diz que a velha, sozinha, teve um ataque e, desesperada, deu com a cabeça no piano de cauda, único bem que herdara do marido playboy falido, morto num quarto do Copacabana Palace na companhia de moças de reputação duvidosa. Eis a explicação para a mancha que se espalhou no carpete do apartamento 1301.
O sangue da testa de Dona Gertrudes, que dividiu em dois a sala de estar do imóvel deteriorado pelo tempo e pela maresia, é hoje o pivô de uma briga judicial entre irmãos que, fatalmente, terminará engrossando o número de óbitos no local.
Dona Gertrudes deixou dois filhos no mundo. Apesar da vida medíocre a aparentemente deprimente, fora uma boa mãe. Mas não o suficiente para garantir o retorno afetivo da prole, que nos últimos anos apenas contribuiu para o desgosto da pobre.
A uma outra Dona, a Itália, síndica do prédio, que ao longo de quase 20 anos afeiçoou-se à senhora do treze-zero-um, foram confiadas – em testamento – as chaves da residência. E exatamente por isso eu estava ali.
Os anos de labuta nas portarias renderam a Itália expertise na administração de imóveis. A fama de boa corretora espalhou-se tão depressa que até os inquilinos de bairros mais nobres já procuravam seus serviços.
Na descrição, o “quarto-sala-banheiro-cozinha-americana-a-duas-quadras-do-posto-9” me pareceu simpático. Mas a realidade dispôs a minha imaginação ao trágico. Ou talvez minha imaginação é que dispôs o trágico à realidade.
O antigo morador, 30 anos, médico e maconheiro, foi abduzido por um bando de alienígenas revoltados com a invasão de robôs da NASA em território marciano. Tava na cara!
O maconheiro era um homem sozinho (condição que vem anunciada na testa do sujeito que procura um apartamento de quarto e sala) e por isso o plano extraterreno foi pro espaço, com o perdão do trocadilho.
Na ausência de ligações, resgates ou qualquer tipo de repercussão internacional diante do seqüestro no posto 9, o rapaz foi devidamente devolvido ao cafofo. Mas não sem antes se deparar com a sanguinária Maria, faxineira que não contava com a presença do patrão em horário de expediente e deu-lhe uma baita de uma vassourada nas fuças, levando o coitado a nocaute.
O jovem morreu, por ironia do destino, na fila da emergência do Miguel Couto, onde deveria estar, supostamente, fazendo plantão.Vida ingrata de la hóstia!
Dona Itália rezou dois Padre-Nossos e cinco Ave-Marias para salvar-se do purgatório diante do alívio que sentiu com o ocorrido. “Era um moço de bom coração. Só que não pagava o aluguel há dois meses. Mas a culpa é do governo. A secretaria de Saúde do Rio é uma verrrgonha”, justificou-se. E sorriu.
Senti um arrepio na espinha. E daquele sorriso amarelo, em que se notava a ausência de alguns dentes, puxei a linha do novelo. Dona Itália não me enganaria mais.
Topei ir ao Flamengo para o que deveria ter sido minha última visita. Sabe-se lá porque o elevador chegava só até o 7º. Subi quatro lances de escadas e dei de cara com um corredor longo e escuro. O apartamento 1111 era o último, lá no fundo do corredor. Caminhei devagar e apreensiva. Enxergava apenas pequenos fachos de luz que escapavam através das frestas e fechadura da porta de madeira.
Bati. Uma anã velha e com orelhas pontudas me apareceu contornada pela claridade que vinha da janela da saleta. Achei prudente não demonstrar estranhamento e segui com minha avaliação. Em princípio, e com exceção da anã orelhuda e do elevador que subia só até a metade do prédio, tudo me pareceu normal. Nada ali evocava minha pré-disposição ao sobrenatural. Deixei o banheiro por último porque, normalmente, esses recintos nos apartamento de quarto e sala são tão pequenos que nem sobra espaço para um assassinato. Digo, normalmente.
Tinha uma banheira branca descascada, dessas bem antigas, cercada por uma cortina de plástico ao lado do bidê. Ali, naquele cenário, a esposa adúltera foi esfaqueada pelo amante que já não mais a agüentava. Faziam duas semanas que o marido traído havia partido desta para uma melhor.
Intrigado com os sumiços repentinos da mulher, o marido lançou-se numa investigação que colocou em xeque sua sexualidade. Observar o casal em situações impróprias, num primeiro momento, provocou-lhe os sentimentos mais primitivos. Raiva, asco, desprezo. Não entendia como a vagaba poderia ter feito tamanha crueldade. Atormentado, desviou o foco dos julgamentos. Passou a se comparar com “o outro”, a observá-lo em cada movimento. Dormia e acordava pensando no homem. Não demorou muito, despencou de amores, do 11º andar.
Corre na boca miúda que o amante refugiou-se num apartamento de quarto e sala em Copacabana e que, antes de se envolver com a esposa safada, relacionava-se com uma senhora que trabalhava como síndica no mesmo prédio onde se esconde agora.
Dizem que ela o manipulava...

terça-feira, 21 de abril de 2009

Em Brasília.


Deixo Madrid. Com o coração apertadinho, mas tranqüila. Volto pra Brasília. Morrendo de saudades e com o sangue correndo rápido nas veias.

Me imagino chegando, saindo do aeroporto, Brasília. O cheiro do ar, a janelinha do carro, o eixão, o túnel da rodoviária, asa norte. Vejo, reconheço, revivo. Tudo tão familiar. O portão, a fada, casa, quarto, banheiro, cozinha...

Mas, de repente, me dou conta que estou deixando Madrid e isso me dói. As minhas coisas, os meus amigos, a minha grana, a minha casa. Isso fica. E não sei como vai ser a ausência disso. Me acostumei a viver só.

Ao mesmo tempo, penso na hora do almoço lá em casa. Reunidos, o mesmo velho assunto: os problemas do Brasil. A comida da mãe, o chimarrão, o “jardim de inverno”. Saltar a janela do meu quarto. Meu coração dispara e as minhas mãos tremem. Tamanha é a emoção que sinto. Me falta o ar.

Aí respiro fundo e olho ao meu redor. O mini-apartamento já bem mais vazio. Clima de mudança. A sensação de estar fechando um ciclo e começando outro. E esse processo é doloroso...

Penso em Brasília ensolarada. Uma tarde na beira do Lago. Nadar! Bater papo e relaxar. Tomar um banho quente e cervejinha com os amigos, no Beiras, é claro!. Depois, samba! Que saudade de dançar e dançar e dançar...

Aqui não toca música de dançar juntinho! É cada um por si. Há pouco contato físico. Muito mais que em Boston, eu imagino (!), mas menos que em Brasília. O que falta por aqui é o abraço. As pessoas não se abraçam. Eu é que abraço as pessoas. Algumas recuam, assustadas.

Penso na lista enorme de abraços que vou dar e receber dentro de uns dias. Sentir o cheiro das pessoas outra vez! Frio na barriga. O coração volta a bater rápido!

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Em Boston



Eu ouvi dizer que Boston estava sempre um ano atrás de Nova Iorque. Escrevo do “atraso”, sem saber ainda direito o que pensar disso.

Acompanho um jovem casal em busca de algo. Uma mudança na vida, claro, e isso inclui muito bate-perna atrás de apartamentos. A cidade tem me encantado – é uma cidade com tudo o que se pode esperar: prédios altos no centro, lojas de rede, bairros descolados cheios de cafés e seus intelectuais, movimento no metrô na hora do rush, meninos loiros dos olhos azuis voltando da sua aula de tênis e gente parada na frente dos bares, fumando um cigarro entre uma e outra merecida cerveja. Talvez sempre um pouco atrás de Nova Iorque, mas por enquanto me parece ser porque aqui o tempo demora mais a passar. Lá, quando vai ver, já foi. Aqui tudo parece estar sendo ainda, calmamente.

Sem qualquer preconceito, andamos entre todas essas figuras e seus bairros, irrigados de significados para eles, não para nós. Nós somos turistas, transitando por entre mundos que não nos pertencem, tentando sem informação mastigada alguma decidir em uma semana qual desses mini-mundos-bairros se encaixam melhor com as pessoas que consideramos ser.

Entendo com meu coração inteiro essa sensação assustadora durante uma decisão tão desinformada dessas. Andar no escuro, saltar com tudo no assustador desconhecido. Já morei em vários cantos de Nova Iorque, e ainda sigo descobrindo coisas novas sobre cada um deles. Do Upper East Side ao fim do Brooklyn, ao Upper West Side, de volta ao meio do Brooklyn, e agora no Lower East Side. A cada mudança, talvez mais perto do meu bairro ideal. Mas a sensação é de descoberta, sempre, mesmo depois de anos. As aparências enganam, só a vivência informa - não, ainda não é esse o lugar onde quero morar.

Tenho estado em crise com Nova Iorque – essa cidade aqui ao lado, sua vizinha mais tranquila da costa Leste, hoje me parece muito mais eu. Do meio do meu contrato de um ano no apartamento e dois anos no mestrado, me vi pensando: “não seria eu mais feliz em Boston? Ou até em Tamandaré?”. Talvez seja só o fim do inverno que demora tanto a chegar, e a exaustão dessa vida sem ar livre, sem vento, seca de radiodores ora frios ora quentes demais, e os dias curtos que fazem a já acelerada vida passar ainda mais rápido; ou talvez a culpa seja da chegada da primavera, e suas “alergias”. Nunca entendi essa mania hipocondríaca norte-americana de alergias, mas tenho me sentido atropelada por mil tratores todos os dias, e um dia alguém disse “é a troca das estações”. Caramba, até as estações do ano para passar doem? Não bastam meus dolorosos e periódicos renascimentos internos e dores da alma?

E a gente segue deixando invernos pra trás, passando por dolorosas (e floridas) primaveras, correndo atrás dos verões. Que, alguns meses depois, passam, e encaramos novos invernos, primaveras, verões, outonos, invernos... Com sorte, nunca no mesmo lugar.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Visitantes de outros filos e classes - 2ª parte

O som insandecedoramente penetrava TUDO. Decidi que era hora de agir. Levantei, tirei o pijama, coloquei uma roupa pra sair de casa, fui até o banheiro e dei um ultimato "eu estou saindo de casa, vou até o supermercado e vou voltar com inseticida. Você tem esse período em que eu estiver fora para sair daqui. Senão, eu vou trazer um inseticida e vou usá-lo". Saí sem olhar pra trás, peguei o carro e fui até o supermercado. Obrigada senhor pelos supermercados 24hs. Demorei mais do que necessário escolhendo minhas armas inseticídicas, dei uma caminhada pelos corredores vazios, fiz tudo o que eu podia para comprar mais tempo pro grilo criar juízo e sair do meu banheiro. Cheguei em casa, abri a porta e não ouvi nada. Tive alguns segundos de alívio. Criiiiiii-Criiiiiiii. A raiva me transtornou. Ele estava pedindo. Entrei no banheiro e ele não parou de fazer barulho. "eu tenho um inseticida comigo e VOU usá-lo!!!" "criiiiiiiiii-criiiiiiiiiii-criiiiiiiiiiiii". Havia chegado a hora do grilo. Comecei a sprayzar inseticida nos cantinhos do forro de gesso e depois de uns instantes o canto começou a ficar mais lento "cri... c-r-i......... c---ri...............". Eu sabia que eram seus últimos crizados e começei a sentir remorso.


Será mesmo que eu precisava ter apelado com o bichinho. Caramba, matei um grilo só porque ele estava seguindo a natureza dele. Poxa. Eu podia ter tido mais paciên! ahn!? criiiii-criiiii-criiiii!!!!!! Ele estava só se fazendo de morto para me fazer sentir remorso. Que mente ardilosa. Foi a gota d´água. Numa explosão de raiva sprayzei novamente inseticida no teto, "bicho maldito!!!! me deixa dormir!!!!". E dessa vez o canto parou e eu dormi sem remorso. Matar um grilo não é legal, ainda mais porque existem pessoas, tipo as chinesas, que acham que eles trazem sorte. Mas matar um grilo cínico e estrategista do mal, que brinca com os sentimentos dos outros, me trouxe um conforto por haver algum tipo atenuante psicológico por estar agindo dentro do meu senso de justiça.


Tive também algumas experiências com baratas. Tipinhos bem fingidos também. Fazem questão de bolar ataques em grupo. Possuem altas habilidades como escaladoras e de movimentação stealth. Usando o inseticida do grilo tive que matar algumas. Não tenho orgulho disso, mas também não me arrependo. Sempre tentei dialogar antes e avisei que estava armada. Às vezes ficava com medo de que o reino animal não fosse entender minhas ações e que os bichos iam deixar de ser meus amigos.


Minha resposta veio numa dessa noites de muito pensar e pouco dormir, quando estava sentada no puff, com os pés na janela, e luzes de casa apagadas, remoendo as feridas, sentindo a solidão pesar mais do que o normal. Pensando em todos os problemas que existem, em todas as dúvidas que sempre voltam, em todas as pessoas que me afetam. Naquelas noites em que você nem ia achar ruim se a sua cama falasse, porque assim iria ter alguém com quem conversar, sabe? Já não aguentava mais não dormir e não parar de pensar. Agonias e ansiedades transbordando. Já estava cogitando pegar o carro e dar umas voltas pra ver se encontrava a tranquilidade em alguma esquina (ou tesourinha) e trazia ela de volta para casa para poder dormir comigo. Quando surge pela janela um vaga-lume. Pequeno. Sozinho que nem eu. Voando aí pela noite, procurando a tranquilidade dele também. Entrou pela janela, deu um rolé pela casinha e pousou no meu pé. Emprestou um pouco da luz dele pra mim e voou embora. Senti que não estava sozinha. Que tinha muita luz pelo mundo, mesmo que eu não estivesse vendo todas elas naquela hora. E que os bichos ainda eram meus amigos. Fui pra cama bem mais leve e sonhei que voava noite a fora junto com o vaga-lume, reconhecendo as luzes confortantes por aí e distribuindo um pouco da minha também.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Time-Organizator-Tabajara


Além deste, tenho quatro outros lindos blogs, que trato com a mesmíssima (des) atenção. Um deles é meu-todinho-meu-ninguém-tasca, o outro pertence ao meu “Eu lírico”, que muito provavelmente deve ter encontrado o príncipe encantado e fugido para a Polinésia, e os dois restantes compartilho com mais cinco jovens moças moderninhas e antenadas, que invejo pela força de vontade, compromisso e organização, que sempre me faltaram.

Alguns desses meus caderninhos virtuais há meses não recebem uma linhazinha sequer de meus pensamentos perdidos. Não por falta de histórias, isso eu posso garantir. Mas talvez pelo excesso delas. Considerando que no último ano me mudei de continente, país, cidade, casa, emprego, namorado e cafeteira pelo menos três vezes, não fica difícil constatar que não é preciso a terra completar um volta em torno do próprio si para que minhas informações se tornem tão obsoletas quanto a Hebe Camargo.

Meu cronômetro anda num compasso diferente, e essa condição tem me colocado em situações digamos, desconfortáveis, e que me remetem uma conclusão iminente: meu rótulo de blefe foi institucionalizado!

Sou ré confessa, sim. (Mas vou para o céu, porque me arrependi). E não me demorarei em desculpas esfarrapadas, porque preciso me concentrar agora numa solução para a maneira frustrada com que administro o meu próprio tempo ou falta dele.
Ontem enquanto cruzava a cidade do Rio de Janeiro dentro de um ônibus lotado e pensava em todos os seres humanos que andam às avessas para com a minha pessoa por conta de percepções temporais incompatíveis, imaginei bem ali na prateleira das lojas Americanas Express (praticamente uma filial da feira do Paraguai), aqui de Copacabana, a solução para os meus problemas de ordem administrativa.

Seria um aparelhinho desses multifunções que englobasse tudo aquilo que tenho que fazer toda semana e nunca consigo. Uma espécie de time-organizator-tabajara, que é muito mais que um reles despertador.

A coisa leria os meus pensamentos, registraria compromissos, dividiria minhas 24 horas em três frentes diferentes: Cadija, trabalho e relacionamento, -- e me faria sempre prosperar! Também organizaria as minhas idéias soltas (que sempre acabo deixando na mesa de algum boteco) por tópicos e me avisaria a hora certa de usá-las para algo realmente útil ou, pelo menos, para me fazer parecer mais inteligente. Ah! Também cuidaria da minha vida financeira, faria as minhas unhas e sobrancelhas e me ensinaria a encontrar a medida certa de pó de café... (Porque eu também compartilho desse mal, Ju).

Tô pedindo muito? Se até o código genético a ciência já conseguiu decodificar, porque cargas d’água não inventam um facilitador de vida pra gente? A humanidade, especialmente a humanidade com a qual eu me relaciono diretamente, seria muito mais feliz.

Ainda aproveito a deixa estendo a minha crítica ao setor farmacêutico. Se já existe pílula até para levantar defunto, porque não existe uminha sequer para fazer com que eu me entenda melhor? Tem? Não tem! Se eu babasse, o que ainda não é o caso, teria. Mas como isso ainda não aconteceu, sigo me enganando com seis doses diárias de floral de orquídeas da floresta.

O quê? Analista? Não, obrigada. Não tenho tempo.




Por Cadija Tissiani

quinta-feira, 2 de abril de 2009

O país do carnaval!


Ontem, pra aula de português, levei um texto que falava sobre alguns “tipos” brasileiros. O caboclo, o pantaneiro, o seringueiro, o gaúcho, o caiçara... Levei também um mapa e os alunos gostaram bastante. Aí, cheguei em casa e fui pesquisar sobre os estereótipos dos brasileiros, tipo carioca, mineiro, baiano, paulista... E me deparei com artigo de umas psicólogas do Rio. “Viajando com jovens universitários pelas diversas brasileirices: representações sociais e estereótipos”, pra quem quiser arriscar.

Dei uma lida e curti porque, na verdade, me dei conta do tanto que esses estereótipos estão entranhados dentro de nós. Me dei conta também de que, freqüentemente, recorro a eles ao falar do brasileiro. O baiano é preguiçoso, o cearense é cabeça-chata, o mineiro é come-quieto, o paulista é branquelo, o carioca é malandro e o gaúcho é macho! hehehe

Mas a verdade é que os estereótipos existem em todas os lugares e não é nada mais do que uma maneira de se identificar com uns e se diferenciar de outros. Gosto de observar os estereótipos madrileños, por exemplo. Os junkies da praça Dos de Mayo, os playboys do bairro de Salamanca, os rastas de Lavapiés, os gays de Chueca, os estilosos de Malasaña, os gitanos, as velhinhas de Goya, os fashions e seus bulldogues, os sudacas, as putas da Montera, os franceses e seus pic-nics no Retiro, os chinos por todos os lados...

Sei que não soa politicamente correto... mas é assim. Acho que os estereótipos, quando não usados de maneira preconceituosa ou discriminatória, são uma maneira de identificar as diferentes “gentes”.

Me lembro de estar caminhando com o Juliano em Amsterdam e ver dois caras, longe, longe, caminhando em nossa direção. Eu bati o olho e disse: são brasileiros com certeza. E digo mais, cariocas! O Ju rio e concordou. Não deu outra, quando passaram por nós comprovamos a tese. Eram os típicos surfistas do Rio, de bermuda, camiseta e havaiana, com um andar balançado, malandro... hahaha

Eu sei, eu sei... mas é verdade!

E tem a história do baiano que queria vender um refri pra Natália em vez do suco de laranja natural que ela havia pedido. “É que tem que ir lá na cozinha, espremer...” Só faltou ele dizer: é que me dá uma lezeira... hehehe Brincadeira!

Agora falando sério, já que eu sou de Brasília e lá só tem filho de político – e os políticos são todos corruptos – posso ser politicamente incorreta, né?

sexta-feira, 27 de março de 2009

Visitantes de outros filos e classes - 1ª parte

Minha paixão com os animais sempre foi um elemento presente na minha vida. Desde a minha decisão de não comer carne até a estudar biologia. Batia o pé para ter animais de estimação, para adotar bichos de rua, para bater no moleque que batia no bicho. Quando era menor e via filmes de guerras e batalhas chorava sempre que os cavalos morriam, "gente tá lá porque quer, se alistou, quis combater, mas e os cavalos, mãe?! é muita sacanagem com eles". Inocências à parte, nessa questão do livre-arbítrio no alistamento humano, continuo achando muita sacanagem com os cavalos.

Na minha casinha, tive alguns incidentes com animais. O mais bizarro foi a presença de um lagarto na janela do meu banheiro (eu moro do terceiro andar de um prédio que não fica no meio do mato). Entrei no box para tomar banho, ia fechar a janela quando vi duas patas bem grande, todas escamentas, amarronzadas, com unhas gigantes e um rabo de iguana pendendo dessas patas. Minha primeira reação, logicamente, foi gritar e sair correndo. Por sorte meu namorado estava presente no dia e eu tenho uma testemunha desse visitante de outra classe, porque sempre que eu lembro dessa história acho surreal demais. Expliquei o porque do meu grito e meu namorado vestiu sua knight shining armor e foi lá fechar a janela pra eu tomar banho. Ela ficou fechada durante toda a noite. Assim como todas as outras lá de casa, fato inédito, porque eu amo vento e sou levemente claustrofóbica. Fico meio agoniada em ambientes totalmente fechados. Mas era uma situação emergencial, afinal eu não ia deixar uma brecha pra iguana entrar e vir fazer carinho no meu pé durante a noite. No dia seguinte, eu vesti minha knight shining armor, recheada de coragem e anti-mulherzinhanismo, e fui abrir a janela para ver se ele ainda estava lá, mas já tinha ido embora. Confesso que fiquei feliz, porque se tivesse que dormir mais uma noite com tudo fechado acho que eu iria passar uma noite de volta na casa da mamãe.

O incidente mais marcante foi logo que eu me mudei, alguns dias depois do incidente com a cafeteira, quando de alguma forma inexplicável, eis que em uma noite surge um grilo no forro do meu banheiro. Nunca cheguei a fazer contato visual, mas o barulho era prova suficiente e inequívoca de que era sim um visitante de outro filo, um grilo. Cantando no volume máxmo que suas asas permitiam, em um ritmo non-stop. Minha primeira tentativa foi estabelecer contato. Entrei no banheiro, acendi a luz e tentei ter uma conversa aberta com o bichinho, "olha, desse jeito nossa convivência vai ser impossível, eu sei que é da sua natureza cantar, mas é da minha dormir, e assim não tá rolando não. Vou abrir bem a janela, fica livre pra ficar em silêncio ou sair por aí cantando, mas aqui e cantando não dá...". O papo se alongou mais um pouco, mas a temática foi sempre nesse sentido. Como ele estava em silêncio durante toda a conversa, fiquei satisfeita que ele tinha entendido o recado, apaguei a luz do banheiro e voltei pra cama. Dois segundo depois que eu me deitei, cri-cri. Criii-criii!! (...)!!

Ok. Se ele quer agir irracionalmente, o problema é dele. Levantei de novo, fui novamente até o banheiro e abri o jogo "meu filho, eu não curto inseticida, não curto violência, amo os animais, mas eu preciso dormir. Eu tenho recursos e posso usá-los. Se você não recuar, eu vou atacar. Guerra é guerra.". Ele, já demonstrando sua faceta cínica, permaneceu novamente em silêncio o tempo todo, mas assim que eu sai do banheiro e deitei, um afrontoso criiiiiiiii. Tentei me concentrar no gandhi e na vitória pela não-violência. Procurei tampões de ouvido. Fechei a porta do banheiro. Tapei a cabeça com o travesseiro. Cri-cri. Cri-cri. Criiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii.

terça-feira, 24 de março de 2009

De repente, sobre a poltrona.


Aqui em NY as pessoas jogam coisa nova no lixo. E a rua transforma o significado das coisas, móveis, eletrodomésticos, obras de arte...

O que importa, na verdade, é que a família voltava de um encontrão daqueles com primos e tios que você não vê durante anos.

Na rua pela qual eles andavam tinha uma poltrona vermelha. Era daquelas de casa, mas tava na calçada, no lixo. Nova, aparentemente inutilizada.

Os pais estavam felizes; o filho, de mau-humor.

A discussão começa quando o menino, impaciente das piadas de poltrona, fala mal da avó, reclama da comida, zomba da tia.

Grito pra lá, cala-a-boca pra cá, e a mãe se sentiu desrespeitada.
O filho não entende, não escuta, não se rende.

O pai, de repente, sentado na poltrona vermelha (presente do lixo, naquela cidade regada a pedestres e buzinas), sente o coração ficando bem pequenininho dentro do peito.

Ele se apóia no braço direito, e uma tristeza profunda, desperta e viva dentro daquele momento banal, salta-lhe dos olhos como que a traduzir o drama familiar.


Por Anita Petry

terça-feira, 17 de março de 2009

Meu encontro com a máfia napolitana


Hoje, depois de muito esquentar a cabeça pensando numa boa mentira pra contar pra vocês, me lembrei de uma história que parece mentira, mas não é. Eu estava lá. E vou contar.

Bom, tudo começou com uma aventura, que era ir à Nápoles tentar fazer um curta-metragem documentário sobre os enormes lixões a céu aberto, às muitas toneladas de porcaria espalhadas pela cidade e... a máfia napolitana! Sério mesmo! É que eu tenho um amigo megalomaníaco, então...

Compramos as passagens de avião e eu comecei a buscar no google informações úteis. Confesso que todas as informações adquiridas e memorizadas não me serviram de muito. Mas, tudo bem.

Chegamos lá já de noite, munidos com o nosso manualzinho de Español – Italiano – Italiano - Spagnolo. “Grazzie mile”. “Io sono brasiliana”. “Io no parlo italiano”. “Tutti avanti, tutti subito”. “Mamma mia”.

Bom, com um pouco de sorte e com a malandragem do rapaz – que mais parece carioca que espanhol – chegamos ao albergue. Primeira prova superada. Nos instalamos e saímos pra comer. Entramos em contato com um italiano amigo de um amigo de um amigo, que trabalha, de vez em quando, esporadicamente, com produções audiovisuais. Beleza! O cara ia nos encontrar na manhã seguinte pra um bate-papo. Pelo menos já tínhamos um bate-papo ítalo-espanhol garantido.

Na manhã seguinte, eis que chega a peça: Andrea. Se existe alguém no mundo com cara de italiano, esse cara é o Andrea. Nos apresentamos e ele, que arranhava um espagnolo, nos convidou pra dar uma volta de carro, assim poderia nos mostrar melhor a cidade e o caos nela instalado. Massa!

Começa o passeio e eu vou, gradualmente, me impressionando. Não é que a máfia italiana despeje resíduos tóxicos em Nápoles. A história é que Nápoles é a lixeira da Itália. Simples assim.

Bom, mas essa é outra história. Sigamos com a aventura.

Depois de um longo dia de “reconhecimento do território”, fomos comer pizze frite e bailar tango! O Andrea se mostrou um craque não somente no quesito guia-turístico como também no quesito pé de valsa. Dançamos e bebemos todas. Saímos daí e resolvemos espairecer um pouquinho na beira do mar. Entramos no carro. Dessa vez era o Giovanni, um amigo do Andréa, que dirigia. O carro arrancou e eu grudei no banco. O cara dirigia feito um louco: cantava pneu, costurava geral, freava bruscamente... E eu parecia um boneco de Olinda no banco de trás. Agarrada no puta-merda, suando frio e pensando: meudeusdocéu, nunca imaginei que seria esse o meu fim!

Chegamos na praia e eu prometi pra mim mesma que voltaria de qualquer outra maneira pro albergue, menos naquele carro. A verdade é que no último dia da viagem eu estava até acostumada com a loucura do trânsito, das motos... mas nesse dia ainda não. Convenci meu amigo megalomaníaco a voltar a pé comigo.

Hoje, passado quase um ano, reconheço que talvez não tenha sido a melhor idéia, mas tivemos sorte. Passamos por brigas de bêbados e garrafas voadoras, discussões acaloradas e esquinas escuras, gritarias italianas e sujeitos estranhos...

Mas isso não foi nada, o melhor estava por vir.

Na terceira noite, depois de um dia inteiro de relax na paradisíaca ilha de Capri, resolvemos sair pra jantar. Na volta pra “casa”, caminhávamos por uma dessas ruazinhas estreitas de paralelepípedo, quando, de repente, vem um carro a mil por hora e, cantando pneu, freia a poucos metros de nós, como que bloqueando a passagem. Descem cinco marmanjos mal encarados e nos olham torto. Eu quase tive um troço. Já havíamos escutado bastantes histórias a respeito dos pilantras locais.

Não precisei dizer nenhuma palavra. Meu amigo estava mais branco que uma folha de papel. Nos olhamos e começamos a correr pela única saída possível: uma pequena rua à direita. Corremos até não poder mais. Olhamos pra trás. Ufa! Nem sinal. Eles deviam estar se divertindo com a nossa desgraça naquele exato momento.

Respiramos e nos situamos outra vez. Seguimos, dessa vez com pressa, pra casa. Já quase chegando no nosso portal, escutamos o barulho de uma moto se aproximando em alta velocidade. Não tive tempo pra pensar. Eu avistei a moto e, encima dela, um homem com um braço estendido ao céu. Em sua mão reluzia uma arma prateada. Caralho! Foi o tempo de grudar na parede e fechar os olhos com força. Meu amigo veio junto, nos agarramos um ao outro e... a moto passou, voando.

Chega! Eu não queria mais brincar...

Em Nápoles as pessoas são demasiadamente espirituosas pro meu gosto...

quarta-feira, 11 de março de 2009

Sobre a couve e as pequenas vitórias


Semana passada aqui em casa teve um grande acontecimento: o Festival da Couve. Na segunda-feira, passando frio e desesperada, joguei no google: caldo verde receita. Nesse tempo frio a lembrança das madrugadas alimentadas a cerveja gelada e caldo verde foi uma das poucas idéias agradáveis a essas mãos cansadas de cozinhar. Não achei que o dia fosse chegar, mas chegou: não aguentava mais ter que comer 3 a 4 vezes por dia. A logística é quase insuportável pra mim - se compro leite, tenho que comer cereal todos os dias no café por uma semana. Se em alguma bendita quarta-feira da semana do cereal eu quiser um misto-quente, paciência. Papai Noel, eu quero pílulas de astrounauta no próximo Natal.

Até a idéia do caldo verde chegar. Brilhante. Comprei os ingredientes e fiz uma panelada. Mais de 2/3 da couve sobram... e o resto da semana foi regado a suco verde, receita especial da vovó. Correndo um sério risco de começar a fazer fotossíntese a qualquer momento (acontece, gente), eu venci a batalha. Não desperdicei, e o placar final foi couve zero; Ju 1.

Aqui em Nova Iorque, quando por um segundo a cidade não te engole e você tem algum controle sobre ela, o sabor é o mesmo. Como no metrô, nosso grande ponto de encontro com tantos desconhecidos esquisitos (e outros nem tanto). O irmão da Anita me contou certa vez, cheio de orgulho, que estava em um carro específico do trem onde o freio fazia um barulho assustador. Ele se assustou da primeira vez, mas depois de algumas paradas virou macaco velho. Se divertia com os novatos, assustados a cada vez que o trem freiava.

Um desses dias no metrô uma mulher ao meu lado começou a passar mal. Suava frio, não dizia palavra com palavra, e por fim vomitou. A equipe da estação a acudiu e o trem ficou parado por uns bons 10 minutos. Fomos relocados para outro vagão e seguimos viagem; a moça seguia com um agente do transporte metropolitano no vagão vomitado, até a próxima estação. No meu novo vagão, ninguém sabia do acontecido. Todos só experimentaram uma parada longa do trem, e no máximo espiaram de rabo de olho alguma movimentação no vagão ao lado - ninguém se atreveria a perder seu assento. Mas eu sabia. Eu possuía a informação que todos desejavam. Eu era ali, ao menos por aquele momento, a rainha. A rainha do vagão vomitado.

São pequenos prazeres, admito.

segunda-feira, 9 de março de 2009

1° dia - 2ª parte

Eu, que costumava dar a vitória ao vento sobre o barulho e só dormia de janela aberta, tive uma noite para repensar esse comportamento. Nunca achei que carros passando fossem ser tão anti-soníferos. Mas foram. Talvez carros somados a uma noite anterior - no mínimo - adrenalizante sejam anti-soníferos. O fato é que entre fechadas de olho e um sono totalmente quebrado, os tais sonhos deliciosos que resultariam em uma incrível e revigorante noite, não aconteceram.

Quando o despertador gritou eu irracionalmente desliguei o tal incômodo, virei pro outro lado e fechei os olhos. Quando eles foram abertos novamente eu já estava 15min atrasada. Pulei da cama e lembrei da cafeteira. Aquela supermegaprática cafeteira elétrica minha amiga que é só por o filtro, o café, a água, apertar o botão e, quase que em um passe de mágica, surge o meu café.

Do alto da minha incrível eficiência extrema, resolvi ser esperta e ao invés de me dar ao trabalho de passar o café na jarra de vidro da própria cafeteira e depois colocar na caneca, - pra que perder mais tempo, né?! - posicionei minha caneca preferida no lugar, medindo com cuidado qual seria o ponto exato para que o café caísse dentro dela. Muito satisfeita minha sagacidade e minha praticidade impecáveis, senti que estava me auto-redimindo depois das trapalhadas na noite anterior, fui tomar banho já me sentindo mais animada por estar dando a volta por cima.

Com café quentinho passado diretamente na minha caneca preferida o dia já ia começar bem, eu ia me sentir melhor e, se é que ficou algum, qualquer trauma da noite anterior seria liquidado. Ia ser tudo lindo. O pequeno detalhe é que a cafeteira mostrou-se extremamente sindicalista e não entrega o café pra ninguém, a menos que esse alguém seja uma jarra de vidro de cafeteira. E pior, ela é daquele tipo de gente que pensa "se eu não vou ter, ninguém mais terá" e solta uma risada maligna no final, só para se divertir às nossas custas.

Quando saí do banheiro, o café que deveria ter caído na minha linda caneca roxa do porco rosa, estava por toda a minha bancada, por toda a parte de cima da cafeteira amarga e por um bom pedaço do chão. Na caneca, necas. E, é claro, que por ter presenciado a cena de ontem e saber da minha relação com a eletricidade, em retaliação à aposentadoria da jarra, ela inclusive jogou café na tomada mais próxima.

Líquido. Na tomada. Líquido que coduz inquestionavelmente bem a eletricidade e pode te matar eletrocutada - vide vários casos de suicídio com inofensivos secadores de cabelo em banheiras. Água, com pó de café, na tomada. Isso significa que eu ia ter que - novamente - encostar na caixa de torturas, porque - obviamente - eu só ia limpar essa armadilha fatal com o disjuntor desligado. E o relógio não parou de contar as horas não, nesse momento eu já estava uma meia hora atrasada. Sem café - em formato bebível, pelo menos - pra começar o dia, sem ter dormido direito, sem um pingo coragem de reagir àquilo tudo (ironia não ter nem um pingo disso e vários mL de café espalhados por vários lugares da casa? Pois é, a cafeteira mostrou-se irônica). Passei reto pelo café e saí de casa sem olhar para o que ficou. Quando cheguei no estágio e contei minhas aventuras tudo já melhorou; me pagaram um cafécompãodequeijoborrachudo de consolo e logo mais eu consegui rir de tudo. Enfim. Lição do 1º dia? Não é só porque o café é legal que a cafeteira também vai ser.

quinta-feira, 5 de março de 2009

CaRtA PoStAdA


PS: Não adianta tentar enganar; essa foi escrita no verão, quando nem a neve nem a presença mágica do Sassá me transformavam a vida ainda.


Amigo de Brasília,

Nossa, meu amigo! Quantos amores você tem vivido! A vida aqui anda corrida, agitada, doída até. E paixões não têm tido muito espaço.
Por vezes, me lembro das histórias malucas pelas quais essa Brasília de cores me viu passar. E tenho saudades.
Saudades do pânico adolescente, de quando a gente tem cer-te-za de que vai morrer de amor.

Hoje em dia, sabendo que disso não morro mais, deixo aquela dor fininha que dá no peito ir e vir como bem entende. Ela manda na gente.

A tranqüilidade me faz diferente.
Encaro essa cidade com um desespero desenfreado que, de repente, me surpreende por conter em si uma maturidade incrível, que me acalma e afaga o ego.
Somos competentes.
Digo e repito: essa cidade estranha aqui, que carrega o mundo todo numa esquina, não me engole.

A saudade que tem me atormentado é da cidade daí. Que é a saudade de casa, dos amigos, de histórias. Brasília tem uma poesia, que é diferente da magia tropical do Rio, que enlouquece forasteiros e os toma o coração por completo, ou da loucura de Sampa, que tenta enganar a gente chegando na hora e abrindo poupanças.
Ainda nova e já tão cantada. Brasília menina.
A saudade que tenho desse planalto vermelho é saudade da minha vida de patins e pôr-do-sol, de teatro, conic, rock'n roll. :o)
Minha vida de copos e kibes (tantos!), de Arleudos, Cíceros, Feitosas...

E agora aqui, sob o calor infernal que os arranha-céus trancam na cidade, a circulação do capital que nos assusta com sua atroz velocidade, e a batalha diária que se trava em torno dele, curioso é o meu andar por entre suas ruas e avenidas. Já desço a cidade a pé como que me adonando de suas luzes, de seus ares. Nuevos Aires.

E minha latino-americanice, minha saudade toda, latina, exagerada, cheia de si, fica guardada nas coisas que eu vivi.

Assim como um dia tanta gente desembarcou nessa cidade menina (onde eu, menina, também cresci), há pouco parti, sozinha. Preciso crescer longe dela, longe do aconchego de seus números e de sua solidão. Sim, essa solidão burguesa que a gente dribla num piscar de olhos, você sabe.
Ela me ensinou lições que tenho posto a prova, sem falsa modéstia, por vezes, de forma brasileira magistral.

Não, não tenho novidades. Ainda tô fodida, lascada e sem dinheiro, mas as boas intuições me deixam serena e feliz.

Aguardo ansiosa as tuas palavras, que sei lá como as escolhe debaixo desse céu de nuvens raras e de tanta poesia.

Beijos,
Sua amiga de Nova Iorque.



Por Anita Petry

segunda-feira, 2 de março de 2009

Despedida.


Ao longo dos anos, aprendeu que para entender as coisas do mundo, e do seu próprio mundo, precisava antes colocá-las no papel. Ao mesmo tempo tinha medo do que as palavras escritas prenunciavam. Talvez tenha sido esse o motivo para tantos meses longe delas: descobrir-se nas entrelinhas a aterrorizava. Mas precisava ir até o fim.

Sentou, pediu um café e deixou que o peso do corpo esbaforido por um calor próximo de 40 graus caísse sobre os cotovelos apoiados na mesinha redonda, escondida nos fundos da cafeteria. Suspirou. Lembrou do bafo quente e do sol escaldante daquela tarde de segunda-feira e do desenrolar barulhento de um dia comum no purgatório da beleza e do caos. Agradeceu aos céus a presença do ar condicionado e ao garçom mediano a gentileza de tê-la deixado ali, esquecida naquele canto, por uma meia hora.

Imaginou as quatro amigas blogueiras e suas respectivas realidades. Foi à Brasília, Nova York, Madri, Paris…Permitiu que o devaneio atravessasse o planeta e aterrissou no ex-futuro-destino asiático. Será possível sentir saudades de algo que nunca teve, que nunca viu ou sequer viveu? Sentiu.

Distraiu-se com pensamentos diversos até o momento das sincronicidades da vida berrarem que era hora de abrir a famosa gaveta de frustrações e puxar da memória cada episódio da história a qual se apegara.

Pensou nas tantas voltas que o mundo dá. E nas tantas outras que ela mesma, malandra, já deu munida dos mais insólitos pretextos, mas sempre com um denominador comum, que tentou abafar até a última das últimas gotas d’água que se foram nessa brincadeira.

Uma raiva genuína a tomara conta. Raiva por sentir-se incompetente. Por ter rodado o mundo buscando uma identidade que não encontraria (e que de fato não encontrou) antes de assumir o ônus e as responsabilidades do adeus. Sentiu ódio de si mesma por ter acreditado com tanta perseverança em algo que não existia. Do apego a um amor entranhado, que tornou-se a lembrança de uma época bonita que foi vivida e o boicote a uma outra que poderia ter sido e não foi.

Porque é tão difícil abrir mão desse sentimento institucionalizado? Sentiu uma dor confusa. Não uma dor física dilacerante do rompimento com o outro, a qual já estava acostumada, mas uma dor mais amena, menos óbvia e muito menos clara do rompimento consigo mesma. A dor de esvaziar o coração, de remover a saudade, de livrar-se de um sentimento que trazia um conforto mistificado e sentir-se definitivamente só.

Despedir-se de um amor é despedir-se de si mesmo. Nunca antes se sentira preparada para isso...

Largou a caneta, respirou fundo, terminou o café já frio, e num suspiro de alívio, disse-lhe adeus.



Por Cadija Tissiani

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

O nó


Era uma terça-feira de inverno em Madrid. Ela caminhava apressada por Chueca, olhava para os lados em busca de um lugar para comer. Tinha muita fome e pouco tempo. Em breve deveria estar do outro lado da cidade, dentro de um escritório escuro e impessoal.

Entrou num pequeno restaurante chamado “El Rincón de Chueca”. Os garçons e os clientes faziam jus à fama do bairro. Eram todos, ou quase todos, homossexuais. Ela se sentou sozinha numa mesa e sorriu. Sempre se sentira bem entre os homens. E, na verdade, sempre desfrutara de uma simpatia especial pelos gays, e era recíproco.

Pediu uma ensalada mixta e salmão a la plancha. Quando já estava por terminar a salada, percebeu que o homem que estava na mesa em frente a sua, sozinho, chorava. Observou-o atentamente durante os quinze minutos de que dispunha para almoçar. O homem se lamentava, murmurava algo para si mesmo. Era uma tristeza profunda.

Em nenhum momento ele lhe pareceu estar zangado ou arrependido de algo. Estava triste. As lágrimas corriam soltas pelo seu rosto. Algumas desciam até o queixo e logo desapareciam no cachecol. Outras eram tragadas junto com os espaguetis.

Ela não entendia como o sofrimento oculto de um anônimo podia causar-lhe tamanho impacto. A cada garfada angustiada daquele homem ela sentia o peito apertar mais. Não conseguiu terminar de comer.

Pediu ao garçom que lhe preparasse o salmão para levar. Pagou a conta, fumou um cigarro e, ao levantar-se para ir embora, foi dominada por um sentimento muito forte. Tremia dos pés à cabeça e, sem tentar reprimir o impulso, levantou-se e foi até a mesa daquele homem.

Inclinou-se para frente e lhe perguntou, com a voz tremida e fraca:

- Perdoe-me, você está muito triste, não?

- Sí...

E viu duas gotas gordas escorrerem naquele rosto desconhecido.

- Posso te dar um abraço?

- Sí...

Abraçou-o como a um velho amigo. Com força. E sussurrou-lhe ao ouvido que não se preocupasse, mesmo sem saber o porquê das lágrimas. Ele, totalmente entregue ao abraço, beijou-lhe o pescoço - com esses beijinhos murchos que quem sofre.

Eles se entreolharam com os olhos cheios de água. Ela não conseguiu dizer nada mais. Despediu-se com a cabeça e se foi. Ele seguiu-a com o olhar.

Ao sair do restaurante, ela sentia o peito repleto de luz, sensação boa, mas que lhe causava dificuldade para respirar. Ele, sentado naquela mesinha, só e perplexo, sentia-se aliviado, como se houvessem desfeito o nó que lhe apertava a garganta.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009


Café do Ponto. Abro o pote e acomodo um filtro Melitta no coador. Ainda nem me olho no espelho, a parada pro café fica entre minha cama e o banheiro, antes do xixi matinal. É essa a urgência.

O café me serve como um corrimão me levando da noite ao dia, entre a cama e a rua, o horizontal e o vertical. Vivo sozinha e não posso esperar um grito de café vindo da cozinha a me acordar. Meu café quem faz sou eu – e um pouco do resto de meu dia também.

Como boa moradora do império do consumismo, me rendo a ele tantas vezes, mas tantas vezes além do desejado. Já tive minha boa cota de máquinas de café italianas – grandes, pequenas, de inox, de alumínio – “são só 10 dólares”, “leve uma caneca na compra da segunda cafeteira”. Para enchê-las, já tive grãos de todas as cores e procedências. É um tal de moído fino, grosso, tostado por X horas a Y graus, da Colômbia, Etiópia ou França, com cafeína ou sem, ou até um leve toque de avelãs.

Não gosto de tantas opções – me sinto uma aleijada no corredor do supermercado, sem forças pra pegar o colombiano, enquanto o francês me olha, desolado. Não suporto a tensão da cafeteirinha, sem saber se a quantidade de pó foi suficiente, se o grão é fino demais e passará pro compartimento do café, se ficará queimado ou não. Pode bem ser pura idiotice, mas nunca fiz um café gostoso nessa maquininha como aquele melado tomado na roça, passado numa meia velha e acompanhado de uma rosca com manteiga, ao som do mugido das vacas.

Eu sei que não controlo muita coisa. E sigo tentando aprender a deixar acontecer, e substituir o destino pela probabilidade. Mas, nos primeiros momentos do dia, eu gosto é do simples e seguro, de ver tudo acontecer, passo a passo: o pó se encharcar, o cheiro subir, e o café gotejar. Exercito com gosto meu pequeno-grande poder e me embalo na segurança do meu café. Aqui em casa, todo dia de manhã, o esquema funciona assim: um coador, um filtro Melitta, e um Café do Ponto importado do Queens.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

1° dia - 1ª parte



Primeiro dia de casinha. Casinha nova, já com livros velhos e cama velha, mas ainda com cheiro, barulhos e luzes novas que não me deixaram dormir bem na tão esperada primeira noite. Isso tudo, obviamente, recheado e bem temperado com muita ansiedade e urgência de enfim começar a tal vida nova: agora vou morar sozinha. Nessa mesma primeira noite, eu, com todos os meus problemas relacionados à eletricidade (ah sim, a eletricidade me tortura. já levei choque em quase todas as estruturas - ditas - não-condutoras. o auge foi um choque que eu levei de um champignon que eu fui roubar da pizza, ainda dentro da caixa de papelão, aberta em cima do fogão. aham, eu sei, ela me tortura e, sim, eu tenho medo.) fui corajosamente colocar uma lâmpada nova no spot novo.

Como não sou totalmente imprudente, desliguei o interruptor da parede, calçei minhas havaianas, coloquei as novas luvas de silicone para pegar coisas quentes no forno, subi no banquinho de madeira e fui colocar a tal da lâmpada nova. A princípio, tudo certo. Nenhum choque, nenhum pipoco, nenhuma faísca. Não é que eu por um minutinho eu fiquei feliz e tive esperança? Desci da cadeira, tirei as havaianas (amo andar descalça; em casa nem chinelo fica no pé em situações normais) e as luvas e me dirigi ao interruptor. Interruptor pra baixo e POW! A lâmpada estourou, o disjuntor caiu e eu fiquei totalmente no escuro, cercada por cacos de vidro que foram espalhados - inclusive - em cima da minha cama.

Minhas opções?
Bom, resumidamente:
1 - dar um chilique, ir até a porta, abrir e mexer na caixa de torturas (a.k.a. caixa de luz, de força, quadro elétrico) e ligar novamente o disjuntor que caiu.
2 - dar um chilique, tentar sacudir os cacos da minha cama no escuro e torcer para não me cortar (porque eu nem um mísero band-aid tinha na casinha) e esperar o dia nascer.
3 - dar um chilique, dormir no tapete de 30x40cm do banheiro e esperar o dia nascer.

Depois de uns minutos, de sentir o chão frio do banheiro e de pisar em um caco de vidro, mesmo tendo certeza de que o meu passo foi rumo a uma direção livre dos pedaços de vidro, respirei fundo, reuni novamente minha coragem, que agora estava espalhada pelo chão junto com os caquinhos, e escolhi o número 1. Pesquei as havaianas com uma toalha e andei até a tal caixa do mal. Disjuntores para cima, nenhum choque elétrico. Coragem reunida. Vassoura estreiada, cama pronta para ser dormível e lá fui eu deitar e tentar dormir - sonhando com o cafézinho que eu ia fazer na manhã seguinte antes de ir pro estágio. Aquele café gostoso, naquela cafeteira elétrica especial que mamãe me deu para que eu não sentisse tanta falta do café materno de todas as manhãs. (rhum, se eu soubesse o que a manhã traria..)

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

De Café e Irlandeses.



Café, pra mim, só se for com uísque.
E, pensando bem, nem com uísque eu costumo degustar.

Gosto de café, mas nunca tenho vontade de tomar. 
Quando tenho, sento e espero passar. 
É que a  minha taquicardia desenfreada tem o poder de acordar vozes de consciência:

“Tomar café pra quê, Anita? Você nunca toma mesmo…”

“Ah, fala sério, duvido que faça falta!”

É, o café não faz, mas uma coisa é certa: tudo que o rodeia me proporciona imensos prazeres.

(lembrando do cheirinho…)

Adoro manhãs acompanhadas, manhãs lentas, pão com manteiga (daqueles de padaria brasileira), música ao fundo, sol entrando pela janela, bate-papo, biscoitinho, cigarro, texto, desculpa pra conhecer alguém melhor;

"Ah, vamos tomar um café qualquer dia desses!"

desculpa pra chegar mais cedo;

"A gente pode sentar e tomar um café..."

pra agradar as visitas…;

"Quer um cafezinho?"

Adoro, então, todos os acompanhamentos da velha xícara, mas ao típico café, eu com certeza prefiro os papos, e com certeza prefiro Irish!

:o)

Anita Petry

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

A história da cafeteira


Era uma bela manhã de março. Eu havia chegado da academia e estava literalmente desmaiando de fome. Resolvi comer antes de tomar banho, assim dava tempo pro corpo esfriar.

Comecei o processo diário de desjejum. Liga a torradeira, bota o pão, separa o queijo e o presunto, serve um copo de suco, toma o remédio da tireóide e... prepara o café.

Não sei se foi o frio tremendo que sentia – ainda era inverno – ou se a fome brutal, mas o fato é que, durante o complicadíssimo processo de montagem do meu aparato fazedor de café, esqueci uma pequena pecinha no escorredor de pratos: o filtrinho.

Nunca menosprezem as pequenas peças! Elas podem ser fundamentais.

Não sei se já ocorreu com algum de vocês... mas, eu digo, não foi divertido.

Bom, passados uns minutos, a cafeteira já estava no fogo, o misto-quente quase pronto e o suco pela metade, quando... pfffffffffffffff chuáááááááááá. Não sei se a onomatopéia descreve bem, mas foi uma explosão.

A tampinha se levantou e o café saltou como um jorro de petróleo salta de um poço recém descoberto. Foi de cinema. Eu, naturalmente, soltei um daqueles gritos de filme de terror, bem agudos e longos. Quase tive um troço. Havia café por tudo e, diga-se de passagem, passei meses encontrando grãozinhos de café esquecidos.

Eu juro que naqueles instantes posteriores ao susto agradeci por viver sozinha. Não seria bacana que me vissem naquele estado lamentável. Encharcada de café até os cabelos, com os olhos cheios de lágrimas (sim, o susto foi grande!) e aquele líquido negro que parecia brotar da janela, do teto, das paredes.
Marieta Cazarré